“Jamais estupraria você porque você não merece”. A agressão de Jair Bolsonaro contra a deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) entrou para a história, como um exemplo da extrema direita estimulando e praticando violência contra mulheres.
Na mesma ocasião, Bolsonaro ameaçou dar um tapa na deputada e lhe chamou de vagabunda. Nosso assunto aqui tem relação com essa covardia.
A presidenta da Assembleia Legislativa do Maranhão, a deputada Iracema Vale (PSB-MA), tem garantido a aprovação de projetos de lei absurdos, antidemocráticos, que afrontam o interesse público e promovem a extrema direita, com todo seu arsenal de violência.
É importante registrar que a deputada Iracema Vale tem o controle absoluto da pauta e das votações do parlamento maranhense. Por isso, ela precisa ser cobrada.
A bola da vez é o Projeto de Lei nº 441/2023, que visava garantir aos pais e responsáveis “o direito de proibir” a participação dos filhos em atividades pedagógicas relacionadas a gênero nas escolas estaduais.
Voz para a extrema direita
O referido projeto, bancado por Iracema, é inconstitucional e prejudica crianças e adolescentes.
Há jurisprudência consolidada no STF quanto a inconstitucionalidade deste tipo de legislação. Sendo assim, o projeto foi vetado pelo governador em exercício, Felipe Camarão, no dia 9 de julho.
Mas esse projeto não deveria sequer ter sido votado na Assembleia, não deveria nem ter chegado ao plenário, não poderia ser levado a sério.
Posando de “democrática”, Iracema Vale possibilita que o discurso da extrema direita ganhe espaço na opinião pública, gere polêmica nas redes sociais e na mídia comercial.
Educação x Violência
Segundo os dados publicados no Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2023, aproximadamente 8 em cada 10 vítimas de violência sexual eram menores de idade.
Em 82,7% dos casos, os abusadores são conhecidos das vítimas e, em relação ao local em que ocorreu o crime, a residência da vítima é o mais comum, com 71,6% nos casos de vulneráveis.
No Brasil, é em casa ou em ambientes familiares que a maioria das vítimas de violência sexual são abusadas. E os seus estupradores são familiares ou alguém próximo das vítimas, que são, em sua maioria, crianças e adolescentes negras, menores de 14 anos.
A escola pode ser um espaço de proteção para as vítimas. É lá que elas aprendem a reconhecer que estão sendo vítimas de violência, recebem apoio e tomam coragem para denunciar.
Mutilação e bullying
Muitas crianças e adolescentes vêm de uma cultura de violência de gênero, naturalizada e arraigada nos seios familiares e transmitida através de gerações.
Por vezes, é na escola que as crianças e adolescentes relatam os abusos sexuais sofridos em casa ou em ambientes familiares.
Se a Assembleia Legislativa propor um debate, uma escuta com as professoras, encontrarão um número alarmante de meninas que se automutilam, que sofrem de depressão por serem vítimas de violência, e de estudantes que, por medo de assumirem sua sexualidade, pensam em tirar a própria vida.
A educação sobre gênero nas escolas é crucial para promover a igualdade, combater preconceitos, prevenir a discriminação, bullying, desenvolver uma consciência crítica, o respeito à diversidade e garantir os direitos humanos.
Excluir os estudantes dessas atividades pode perpetuar estereótipos de gênero e limitar o desenvolvimento de uma sociedade mais livre, justa, inclusiva, respeitosa e solidária.
A violência contra crianças e adolescentes é um caso de saúde pública e a Assembleia Legislativa do Maranhão deveria legislar em favor de garantir proteção, atendimento especializado e educação para mudar essa triste realidade.
É de fundamental importância que os conhecimentos sobre sexualidade, gênero e desenvolvimento dos sistemas reprodutores e nervoso seja garantido nas escolas. Como professor de Ciências e Biologia da escola pública vejo o quão é imprescindível a mediação desses conhecimentos para as crianças e adolescentes poderem inclusive identificar práticas de abuso sexual, que infelizmente se mostram cada vez mais recorrentes.