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Deixe- Me Viver! Este Território É Sagrado!

Liderança quilombola na beira da rodovia da BR-135 | Foto: Dayanne Santos

Anacleta Pires da Silva, Dayanne da Silva Santos e Carla Cristina Barros Pinheiro

Pessoas e encantados contra o projeto de morte de duplicação da rodovia/BR-135

(Itapecuru-Mirim/MA, Brasil)

Santa Rosa dos Pretos[1] é um território quilombola composto por 20 quilombos e com mais de 800 famílias, está situado no município de Itapecuru-Mirim no estado do Maranhão, Brasil e historicamente luta pela defesa do seu território ancestral. Tendo mais de 300 anos de história, os pretos e as pretas de Santa Rosa vivem em uma comunidade que nas últimas décadas foi atravessada, violentada e impactada por grandes empreendimentos (Estradas de Ferros; Linhões de energia; Rodovia BR 135 e Fazendeiros) invasores externos.

A luta de Santa Rosa dos Pretos é internacionalmente conhecida. Parceiros, amigos e apoiadores se encontram em toda parte do mundo para fazer eco às denúncias de violações de direitos humanos que desde os anos 1980 só aumentam as desigualdades raciais/sociais locais.

Por que será que se tem “o preconceito de não ter preconceito” e ao mesmo tempo se acha natural que o lugar do negro seja nas favelas, cortiços e alagados? (GONZALÉZ, 1984, p. 238). É interessante observar como o Estado deslegitima a existência dos grupos que existem em áreas lidas como de povos e comunidades tradicionais, e de grande interesse do capital estrangeiro.  Os territórios são desvalorizados e depois supervalorizados em transações internacionais para a expansão de logísticas desenvolvimentistas no Brasil.

As memórias, os tambores, os corpos, os cantos são possibilidades do povo negro da diáspora se conectar com mãe África mesmo vivendo em terras Pindorama, ou seja, são as possibilidades de (re)existir em um país fraturado pela colonização, pela escravidão e forjado no mito da democracia racial. As memórias de um Itapecuru – Negro[2] reafirmam a existência de mais de 80 quilombos que mantêm viva sua cultura, encantarias[3] e tradições, ou seja, cosmovisões afro-brasileiras que legitimam o protagonismo do povo negro na constituição da sociedade brasileira (ANJOS, 2006; BISPO, 2015).

Leia também: É quarta! Feira da Resex de Tauá-Mirim

O mito da democracia racial e o racismo que vem com a onda de desenvolvimento econômico legitimam as violência e violações de corpos e territórios negros no estado do Maranhão. Tal cenário é maquiado ou invisibilizado pelas grandes mídias e obrigam as/os quilombolas a uma segunda escravidão.

Destacamos que desde 2017 a BR-135 está sendo duplicada e uma série de regulamentações ambientais que dizem respeito a escuta prévia foram violadas para a passagem do concreto sobre corpos pretos, sobre a mãe natureza que é de onde provém a vida e o sustento dos povos e comunidades tradicionais, sobre os encantados que fazem parte da força política do axé de luta do povo preto.

Denunciamos que cabeceiras de igarapés já secaram,  que o velho igarapé grande Simauma foi danificado pelos concretos da Estrada de Ferro Carajás; uma das grandes áreas de roças foram violentadas pelos linhões de energias, o que impacta diretamente na soberania alimentar dentro do território quilombola, pois a roça de toco, a agricultura de subsistência ainda é uma economia comunitária milenar, forte e permanente dentro dos quilombos.

Essas violências têm se intensificado a partir de 1980 teremos a Estrada de Ferro Carajás que anos depois será duplicada. Logo depois chegam os fazendeiros, a ferrovia transnordestina e os linhões de energias. Estes empreendimentos juntos formam um corredor logístico de exportação de commodities e novamente objetificam as pessoas não brancas e seus territórios.

 Nesse contexto, a mitigação é a manutenção da violação colonial, onde o opressor paga para continuar te violentando. Os territórios quilombolas estão sendo fatiados e áreas essenciais para manter a vida, autonomia e a liberdade foram e são roubadas/invadidas e cercadas pelos projetos de morte da branquitude, pelo Estado. Questionamo-nos: é possível mitigar um rio, a Matinha ou um igarapé que também são moradas de mães d’águas?


[1] DOC COMPLETO_O Mundo Preto Tem Mais Vida – https://www.youtube.com/watch?v=zc4Ok8h3aEc

[2] Itapecuru -Mirim é um município localizado na Baixada Maranhense. Marcado por mais de 100 comunidades negras, mais de 80 comunidades quilombolas. E praticamente todas encontram-se em conflitos por terra. 

[3] Sobre a forças dos encantados na luta quilombola ler: TERRA DE ENCANTADOS, https://lojahucitec.com.br/produto/terra-de-encantados-a-luta-pela-permanencia-no-territorio-quilombola-santa-rosa-dos-pretos-itapecuru-mirim-ma-anacleta-pires-da-silva-dayanne-da-silva-santos/

Referências

ANJOS, José Carlos Gomes. No território da linha cruzada: a cosmopolítica afro-brasileira. Porto Alegre: Editora da UFRGS/Fundação Cultural Palmares, 2006.

SANTOS, Antônio Bispo dos. Colonização, Quilombos, Modos e Significados. UNB. Brasília, 2015.

GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Revista Ciências Sociais Hoje, Anpocs, p. 223 – 244, 1984.

Sobre o autor

Anacleta Pires da Silva, Dayanne da Silva Santos e Carla Cristina Barros Pinheiro

Anacleta Pires da Silva é pedagoga formada pela UFMA, liderança quilombola, caixeira do Divino Espírito Santo integrante e pesquisadora mestra do Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA/UFMA). | Dayanne da Silva Santos é mulher negra, mãe, educadora popular e de terreiro. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Sociologia da UFRGS; Pesquisadora do Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA/UFMA) – e do Laboratório Urgente de Teorias Armada (LUTA-UFRGS). | Carla Cristina Barros Pinheiro é historiadora, graduada em Licenciatura em História pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Cartografia Social e Política da Amazônia - UEMA. Membra do Coletivo Negro da UFMA (CONEGRU). Pesquisadora do Grupo de Estudos: Desenvolvimento, Modernidade e Meio Ambiente (GEDMMA), registrado no Diretório dos Grupos de Pesquisa do CNPq e Centro Membro Pleno do Conselho Latino-americano de Ciências Sociais (CLACSO).

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