Igor de Sousa
O Jornal Vias de Fato foi um dos mais importantes canais de comunicação popular no Maranhão.
Foi fundado sob a influência de dois eventos marcantes ocorridos no Maranhão, entre 2006 e 2009: o Vale Protestar, movimento popular contra os desmandos da oligarquia Sarney e a cassação do governador Jackson Lago.
Naquele jornal se viu circular uma infinidade de artigos e entrevistas, além das icônicas charges do poeta e co-fundador César Teixeira. Textos sobre a cena cultural feitos por Zema Ribeiro e artigos de Flávio Reis, Wagner Cabral e Flávio Soares, Meire Ferreira. Entrevistas com Manoel da Conceição, Freitas Diniz, Dom Xavier Gilles, Victor Asselin, João Pedro Stédile, Claudia Santiago, Silvio Tendler, Meire Diniz e tantos outros.
Cabe destacar a cobertura de acampamentos e protestos do Movimento Quilombola do Maranhão (MOQUIBOM) faziam parte do jornal mensal.
Naquele momento brasileiro, em que alianças PT-PMDB, tinham dado o tom do jogo por alguns anos, tinha-se a possibilidade de tentar furar a bolha do discurso oficial e do isolamento de entidades da sociedade civil local.
O discurso oficial defendia que tinha espaço para todo mundo, todos eram bem-vindos na festa pela democracia que reunia ao mesmo tempo setores progressistas, agronegócio e oligarquias regionais, sem falar dos acenos ao mercado financeiro.
Por sua vez, entidades locais tinham dificuldade de conciliar agendas próprias e enfrentar os dilemas de pensar e agir conjuntamente a partir da realidade maranhense.
Era o período de Roseana Sarney recém retornada ao governo estadual com a benção de Lula, graves conflitos fundiários no campo maranhense e “muita lagosta” no Palácio dos Leões.
Muito se acumulou nessa jornada de aprendizados e (im)possibilidades. Um jornal impresso, apesar da força política e simbólica, se tornava difícil de custear e a comunicação online despontava como veículo de informação e consulta.
É assim que se tem a passagem de um veículo impresso para o desafio da produção de programas diários de webjornalismo.
A Agência Tambor nasce, a partir de um seminário ocorrido em 2017 com ampla participação da sociedade civil, quebradeiras de coco babaçu, indígenas, quilombolas, jornalistas, estudantes universitários e professores e uma articulação direta envolvendo rádios comunitárias e setores sindicais.
Em um país e estado, marcados pela concentração de poder e desigualdade, obviamente que o resultado é também a concentração de recursos públicos em emissoras e canais de comunicação corporativos vinculados a grupos políticos e pautas hegemônicas, que invisibilizam amplos segmentos sociais ou lhes oferecem uma captura na lógica fetichista de mercado.
Como tem sido comum ouvir em entrevistas da Agência Tambor, este é um espaço caro e que deve ser cuidado pela sociedade civil maranhense, esta que age com autonomia e para além das chancelas de diferentes governos.
Neste espaço, tem sido possível ver emergir pautas diversas, como aspectos relacionados a educação popular, violências, étnico-raciais, cidade, diversidade sexual, saúde e afins. Em um momento de mentiras contadas como verdades e a necessidade de isolamento social, tem sido feito um esforço imenso para informar sobre a Covid-19, seus efeitos e formas de contaminação, entrevistando médicos e especialistas no tema.
Ouso dizer que no Maranhão o principal veículo de comunicação popular é a Agência Tambor, honrando compromissos de ontem e desafios de hoje. O cenário mudou e mudou para pior. Que sejamos capazes de coletivamente enfrentar o hoje!
*É antropólogo, assessor da Cáritas Brasileira e ligado a Agência Tambor.
Linda matéria!