Por: Coletivo de Comunicação em apoio ao Cajueiro
11/12/2020
“Eu não estou ocupando a terra de ninguém, eu ocupo o que é meu. Tenho raiz aqui”. As palavras firmes e cansadas são do seu João Germano da Silva Seu (Joca de 86 anos), um dos moradores mais antigos do Cajueiro. Ainda sob as ameaças do contágio da Covid-19, adoentado com uma inflamação no pé que inviabiliza a sua locomoção, ele recebeu esta semana, a notícia sobre a imissão provisória de posse em favor da empresa Tup Porto São Luís, para a construção de complexo portuário com total apoio do Governo do Maranhão, no território em que vive há mais de 40 anos.
Violência institucional
São inúmeras as violências praticadas contra o seu Joca. A começar pela sua condição de idoso. O Estado do Idoso, em seu artigo 37, garante que o “idoso tem direito a moradia digna, no seio da família natural…”. A Constituição Federal assegura no artigo 230 que o “…Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”.
A decisão judicial, oficializada pelo juiz Marcelo Oka, traz o pedido de reforço policial hábil a amparar a execução da imissão na posse. “Uma violência cometida pelo Judiciário por meio de um processo tendencioso com vários vícios processuais e questionado pelo Ministério Público e com total apoio do Governo do Estado ao empreendimento chinês que atenderá ao agronegócio”, enfatizou as vozes dos apoiadores do Cajueiro.
“O que é que eu quero, eu morando aqui no Cajueiro, com todo o sossego, com toda a paz, o que é que eu quero com um porto pra atracar navio? Isso aí o governador tem interesse nisso aí, mas eu não tenho”, desabafou seu Joca em depoimento ao Raízes do Cajueiro, uma rede social de denúncias e resistência a tudo que acontece no território.
Seu Joca e mais quatro famílias foram/são alvo de ações de desapropriação movida pela empresa. Atualmente, somente ele resiste na área mais próxima do complexo portuário. O irmão Pedro Sírio, que mantinha o mesmo posicionamento em não deixar a sua história pra trás, faleceu de Covid-19 no primeiro semestre desse ano.
Eles construíram suas vidas e seus lares próximo a praia de Parnauaçu. Lembra que quando chegou descia há qualquer hora para pescar. No quintal de sua casa, conta a história de cada árvore plantada, há mais de 40 anos. “É uma luta tremenda, tão chata. Eu nunca tinha visto uma coisa dessas. Eles dizem: eu tenho muito dinheiro e eu faço o que eu quiser, aqui quem manda sou eu”, finalizou.
Histórico do Cajueiro
Agosto/2019 – Violenta reintegração de posse no território do Cajueiro
Outubro/2019 – Caso é denunciado ao Conselho Nacional de Direitos Humanos
Fevereiro/2020 – audiência tendenciosa com o aval do juiz Marcelo foi realizada e não houve acordo com seu Joca e seu Pedro
Março/2020 – Anulado decreto estadual que gerou despejos no território do Cajueiro
Junho/2020 – Revogação da anulação do Decreto pelo Tribunal de Justiça do Maranhão
Dezembro/2020 – Omissão provisória de posse em favor da empresa Tup Porto São Luís
Processo tendencioso
O MPE, por meio da Promotoria Especializada em Conflitos Agrários, coloca em cheque a validade do documento imobiliário apresentado pela empresa portuária. A suspeita é que exista uma organização criminosa que teria grilado terras na região e agido para o empreendimento avançar.