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Entrevista Benedito Coroba – Uma exceção à regra

 


Ele foi Promotor de Justiça no Maranhão por mais de vinte anos. Antes disso, foi deputado estadual de oposição, no começo da década de 1990. Agora, já aposentado do Ministério Público, se elegeu prefeito de sua cidade natal, Itapecuru Mirim, vencendo uma candidatura milionária e de viés oligárquico.

Estamos falando de Benedito Coroba, que no último dia 15 de dezembro conversou com a AGÊNCIA TAMBOR e falou sobre vários assuntos, entre eles o combate às máfias do Maranhão, os poderes de Sarney e Flávio Dino, as consequências da recente eleição de São Luís, a necessidade urgente de preservação do Rio Itapecuru e sobre seus futuros desafios como prefeito. Leiam a entrevista na integra.

Por Emilio Azevedo

18/12/2020

AGÊNCIA TAMBOR – No Maranhão de novas e velhas máfias, como foi ganhar uma eleição municipal contra adversários que tinham um poder econômico muito maior que o seu?

Benedito Coroba – Em relação a isso, Emílio, eu vejo que houve um fenômeno, não sei se ocasional, em que essa política clientelista chegou a uma certa exaustão em Itapecuru. E o povo optou pela mudança. Mas essa situação do poder econômico, do poder político, do poder da comunicação, continua sendo o grande problema nas eleições. Porque, é regra esse poder decidir as eleições. O que houve em Itapecuru foi uma exceção. Um fato isolado. Acho que nós precisamos de uma reforma política no Brasil que possa igualar a disputa entre os candidatos.

AGÊNCIA TAMBOR – E agora que o povo de Itapecuru sinalizou que deseja mudanças, quais os maiores desafios de sua futura administração como prefeito?

Benedito Coroba – É o desafio de qualquer administração no Maranhão. Nós temos dois grandes problemas. Um é exatamente o que falamos a pouco, que tem origem no abuso de poder econômico. Isso tem uma repercussão na eleição e também nas administrações. Porque essas organizações econômicas, por conta do seu “poder de fogo” conseguem emplacar empresas, ganhar as licitações. Como promotor de Justiça eu via isso no Maranhão. Essas empresas ganham as licitações e não prestam um bom serviço para a população. E são empresas caras. Os preços são altos e os serviços de péssima qualidade. E isso tem uma repercussão natural na administração. São obras mal feitas, serviços mal prestados. Esse é um grande problema que eu vejo. Outro grande problema é que os municípios do Maranhão sofrem da chamada má gestão. Em regra, os municípios não têm poder de investimento. Os recursos que vem para os municípios são “torrados” pela má gestão. E os municípios ficam numa dependência, quase que absoluta, do Estado e do Governo Federal.

AGÊNCIA TAMBOR – E tem como corrigir isso?

Benedito Coroba – Acho que sim. Temos dois grandes eixos pra equacionar esses problemas. Primeiro, nós temos que ter governos honestos. E depois nós temos que ter governos com boas gestões. Acho que honestidade e a boa gestão podem equacionar esses problemas.

AGÊNCIA TAMBOR – E qual a prioridade em Itapecuru? Alguma área mais delicada, saúde, educação, infraestrutura?

Benedito Coroba – Eu tenho dificuldade em falar em prioridades. Nós temos problemas muito sérios com [abastecimento de] água; infraestrutura. Temos problema com a educação; estamos com o IDEB lá em baixo. Na saúde estamos com índices lamentáveis. Entendeste? Não temos uma política de cultura, não temos uma política de agricultura. Por exemplo, nós não temos uma política de agricultura familiar, que seria uma das saídas para a gente melhorar a qualidade de vida, o poder aquisitivo dos trabalhadores rurais.

AGÊNCIA TAMBOR – Você pensa em investir em agricultura familiar?

Benedito Coroba – Penso! Uma das coisas que nós vamos trabalhar muito é na agricultura familiar. Agora, se eu disser, eu tenho uma prioridade, pode ficar o sentimento que alguma coisa vai ficar sem atenção. E como nós estamos nesse mar de dificuldades, acho que temos que pulverizar as atenções e ver todas as políticas.

AGÊNCIA TAMBOR – E o Coronavírus, em Itapecuru?

Benedito Coroba – Eu ainda não tenho dados oficiais, científicos, sobre a situação no município. Aparentemente, tá controlado. Nós passamos a campanha e era como se não existisse. Mas fala-se em uma nova onda e isso é preocupante. Vejo muita gente preocupada. Então, é algo que a gente vai ter que dar uma atenção especial.

AGÊNCIA TAMBOR – Voltando a questão das máfias, já faz tempo que se fala da ação de poderosos agiotas na política do Maranhão. Como o senhor avalia as recentes ações da Polícia Federal investigando figuras supostamente envolvidas com agiotagem no Estado; um esquema que teria como pivô um deputado federal do Maranhão?

Benedito Coroba – Acho que as ações ainda são muito tímidas para realidade que se vive no país. Entendeu, Emílio? Eu acho que o Brasil tem que dar passos mais largos em relação a isso. Um fato aqui outro acolá é bom, né? A gente vê que há alguma ação. Mas essas ações são muito tímidas. Nós não vamos equacionar esse problema das organizações criminosas, da força desse poder econômico, com esse trabalho, que eu considero tímido, dos órgãos de fiscalização. A Polícia Federal faz um bom trabalho? Faz. Mas é pouco. O Poder Judiciário tá muito emperrado. O Ministério Público também não desempenha o papel que deveria desempenhar. E essa crítica que eu faço às instituições, é uma crítica construtiva, pois eu não sei qual a repercussão disso, daqui a um certo tempo, sobre a credibilidade delas. Acho que é um momento que as instituições têm que se preocupar. Porque o fenômeno existe e a tendência é crescer. E as instituições têm que estar preocupadas nesse combate. Há, inclusive, a possibilidade de uma crise institucional em razão disso.

AGÊNCIA TAMBOR – Qual seria o caminho, Coroba?

Benedito Coroba – O caminho seria as instituições, urgentemente, procurarem se fortalecer mais ainda. Elas têm que entender que o seu papel é ainda muito pouco, para realidade que nós vivemos. O Ministério Público e o Judiciário podem, às vezes, até estarem bem avaliados, sei lá, mas é insuficiente o papel dessas instituições, para realidade que nós vivemos. Muito insuficiente. O sistema constitucional brasileiro, inclusive, fortaleceu o Ministério Público, os Tribunais de Contas, a Polícia Federal, o próprio Poder Judiciário…

AGÊNCIA TAMBOR – Mas as organizações criminosas ainda têm muita força…

Benedito Coroba – Muita força, muita força…

AGÊNCIA TAMBOR – No caso do Maranhão, há os madeireiros…

Benedido Coroba – Os madeireiros e etc. O tráfico de drogas, o tráfico de armas. Enfim, uma serie de problemas, e o Estado Brasileiro ainda está impotente em relação a tudo isso.

AGÊNCIA TAMBOR – Você faz parte de uma geração que viveu num Maranhão dominado pelo grupo Sarney. Que tipo de mudança nós tivemos após a aposentadoria do ex-senador?

Benedito Coroba – Houve uma mudança. Só o fato de o grupo Sarney ter apeado do poder já é uma mudança. Agora, acho que a nossas expectativas estão aquém. A gente esperava que o Maranhão estivesse hoje numa situação melhor. Acho que o Maranhão tem que melhorar sua classe política. Acho que o Maranhão tem que consolidar esse processo de mudança. Eu vejo que o sarneysmo ainda não morreu. Ainda está presente.

AGÊNCIA TAMBOR – Tá presente em pessoas ou em métodos?

Benedito Coroba – Olha, eu vejo que os métodos de Sarney ainda estão muito presentes na política maranhense. Houve uma mudança de pessoas, mas os métodos ainda estão hoje muito presentes.

AGÊNCIA TAMBOR – Qual sua avaliação dos governos de Flávio Dino?

Benedito Coroba – Acho que é importante se fazer uma avaliação pós-governo. Avaliando as consequências. Hoje, acho que seria precipitado. Ele teve um primeiro governo, tá no curso do segundo, e uma avaliação mais acurada do governo dele tem que ser feita depois, pra que a gente possa avaliar com mais propriedade.

AGÊNCIA TAMBOR – Você é do PSB. Já foi deputado pelo partido. Voltou agora, depois de mais de 20 anos. Como observa a possível filiação de Flávio Dino no PSB?

Benedito Coroba – Acho que o PSB ganharia com a filiação de Flávio. Mas também, o que a gente observa, dependendo da conjuntura, não sei se teria um ganho pra Flávio. Porque eu noto uma divisão. Não sei se Weverton e Flávio estarão juntos na eleição estadual. Se eles estiverem juntos, a vinda para o PSB será um ganho pra Flávio. Mas se estiverem separados, a gente sabe que o PSB do Maranhão tem uma perna de Weverton. Então, se eles tiverem separados, o PSB não será um ninho seguro pra Flávia Dino.

AGÊNCIA TAMBOR – E como você avalia o resultado da eleição em São Luís? Interfere na conjuntura pra 2022?

Benedito Coroba – Acho que sim. Sempre, no Maranhão, a eleição de São Luís teve uma grande repercussão na política do Estado. É como eu disse a pouco, no resultado dessa eleição ainda há uma presença do Sarney, ainda há uma presença do sarneysmo. Vejo também que o povo de São Luís guarda uma certa identidade, quando, nas eleições, se apresenta contrário ao Poder Estadual. Isso aconteceu, por exemplo, em todo o sarneysmo. E agora o povo de São Luís resistiu a uma candidatura que era do Flávio.

AGÊNCIA TAMBOR – Se mantém uma tradição.

Benedito Coroba – Sim, mantém certa tradição. Na eleição passada, em São Luís, houve um triunfo do Flávio, mas numa eleição muito apertada. Então, eu vejo o eleitorado de São Luís sempre tendente a mudar.

AGÊNCIA TAMBOR – Então, para 2022, o resultado da eleição de São Luís vai interferir?

Benedito Coroba – Acho. Acho que a eleição de São Luís vai ter uma grande repercussão na eleição estadual. Não sei quem serão os candidatos, mas essa eleição já apresenta um certo rumo para as eleições estaduais.

AGÊNCIA TAMBOR – São Luís e várias outras cidades precisam do Rio Itapecuru para seu abastecimento de água. Nós sabemos que ao longo do seu curso, este rio sofre uma série de agressões. Que tipo de parcerias e medidas podem e devem ser feitas em favor da preservação desse Rio?

Benedito Coroba – Eu vou aqui fazer uma crítica no atacado. Acho que o governo federal, governo estadual e os governos municipais não deram a devida atenção ao Rio Itapecuru. E não só ao Itapecuru, mas a outros rios maranhenses. E aqui é uma crítica geral…

AGÊNCIA TAMBOR – E isso preocupa, Coroba?

Benedito Coroba – Preocupa, porque nós temos que correr atrás. Tem que correr atrás. E também não vou culpar apenas um ente federativo, porque essa é uma questão muito séria. E tem que ter ações integradas do governo estadual, federal e dos governos municipais, pra que a gente tenha uma política de sustentabilidade em relação ao meio ambiente, em relação à preservação dessas bacias.

AGÊNCIA TAMBOR – Assim como São Luís, a cidade de Itapecuru também será muito prejudicada com a degradação do Rio.

Benedito Coroba – Sem dúvida, haverá prejuízos muito grandes. Agora, a própria Caema, que se vale do Rio Itapecuru, que busca sua água no Rio Itapecuru para distribuir, tem uma dívida muito grande com o Rio. Então, esse órgão do Estado deveria ter uma grande preocupação. E não tem. Por isso que eu faço essa crítica, dizendo que os diferentes entes federativos têm que ter essa preocupação. Inclusive de também mobilizar a sociedade. E isso não tem sido feito. Eu acho que temos uma oportunidade agora, não é tarde pra se fazer isso. Embora eu ache que isso já deveria ter sido feito.

AGÊNCIA TAMBOR – Nós temos bons exemplos disso, no país?

Benedito Coroba – Sim, no Mato Grosso do Sul nós temos exemplos de ações integradas em determinadas bacias hidrográficas.

AGÊNCIA TAMBOR – E a prefeitura de Itapecuru, sob sua gestão, pensa em tomar iniciativas em relação ao Rio?

Benedito Coroba – Sim, vamos bater na porta do Ministério do Meio Ambiente, vamos procurar o governo do Estado, através da secretaria de Meio Ambiente. E também vamos interagir com os municípios da Bacia. Vamos ter que fazer alguma coisa.

AGÊNCIA TAMBOR – Qual a sua mensagem final para o público da Rádio Tambor?

Benedito Coroba – Eu gostaria de dizer que, apesar de tudo que nós estamos vivendo, minha mensagem é de esperança. Acho que nós ainda podemos dar uma contribuição nesse cenário, pra que se possam ter melhores dias. A esperança é esse combustível que nos move pra continuar lutando. Não é à toa que, com 62 anos, ainda continuo na política. Podia estar aposentado, de pijama ou tomando banho de rio. Mas o rio tá poluído! (risos). Então nós temos que fazer alguma coisa pra mudar esse quadro.

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