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EDITORIAL – A paz de Sarney e as tragédias do Maranhão

Carlos Brandão e José Sarney | Foto: Divulgação

A foto de um homem coberto de sangue circulou no Maranhão no dia 29 de abril de 2022, algumas semanas após Carlos Brandão assumir o posto de governador do Estado.

A imagem do homem ensanguentado, trágica sob todos os aspectos, é do maranhense Edivaldo Pereira Rocha, líder quilombola e filiado ao PT.

Ele foi executado com oito tiros, naquele dia 29 de abril de 2022. Foi morto por pistoleiros.

Edivaldo foi vítima de uma guerra declarada contra as comunidades rurais do Maranhão, que tem suas terras invadidas pelo agronegócio.

Ele vivia no município de São João do Soter, no Quilombo de Jacarezinho, uma das centenas de comunidades maranhenses envolvidas em conflito de terra.

Uma foto do mesmo Edivaldo Pereira Rocha ilustra o cartaz lançado neste ano pela Campanha Contra a Violência no Campo, uma ação no país que envolve várias organizações ligadas aos direitos humanos e à classe trabalhadora.

A foto do maranhense de Edivaldo Pereira, no centro da imagem, ilustra o cartaz de 2024 da Campanha nacional Contra a Violência no Campo

E o governo Brandão segue sendo cobrado a elucidar o caso, a informar quem mandou matar Edivaldo.

Mentira em forma de gente

Não existe paz sem justiça social. Esta frase define a crença que mobilizou Dom Helder Câmara, o bispo cearense que no início da década de 1970 foi indicado para o prêmio Nobel da Paz.

Dom Helder Câmara indicado para o Nobel da Paz

Lembramos da luta de Dom Helder e do martírio de Edivaldo para denunciar José Sarney.

O antigo coronel da política maranhense parabenizou o atual governador Carlos Brandão por ter “pacificado o Maranhão”. Cinismo absoluto? É bem mais do que isso! É violência na veia!

Segundo José Sarney, esta pacificação seria a obra “mais importante” do atual governador, que colocou o “estado em clima de paz, em clima de tranquilidade, um clima que nós precisávamos”.

José Sarney é conhecido por suas mentiras. Ele por si só já é um grande embuste. É um oligarca que se impôs ao país pelo poder acumulado no submundo da politicalha. É uma espécie de patrono do Centrão, que serve a todo e qualquer governo.

E ao dizer que o Maranhão vive “um clima de paz”, Sarney está sendo o que sempre foi: padroeiro de atrocidades e encarnação ancestral das fake news.

O patrono do Centrão ao lado de Jair Bolsonaro

Pacifismo à moda Sarney

A morte de Edivaldo Pereira Rocha não é um caso isolado. A violência e a miséria no Maranhão são consequências de um modelo econômico bancando pela estrutura oligárquica local.

O modelo se estabelece na concentração de terras (agronegócio) e no avanço da mineração. Ele gera imensa exclusão social, gravíssimos crimes ambientais, entre outras formas de violência, incluindo o assassinato de lideranças rurais

Trata-se da mesma estrutura de poder que Sarney comandou por quase cinco décadas e que pariu outras criaturas que também exercem o poder como se estivessem nos séculos XVIII ou XIX, como é o caso de Carlos Orleans Brandão Júnior.

O Maranhão hoje é o estado brasileiro com a menor renda per capita mensal, segundo dados de 2023, divulgados em fevereiro deste ano pelo IBGE.

E o estado segue colecionando os maiores índices de violência no campo, se mantendo classificado entre os que mais matam lideranças de comunidades rurais.

Só no município maranhense de Arari, foram assassinadas seis lideranças por conflito de terra entre os anos de 2020 e 2024.

Joel Roque sofreu atentado e morreu em abril de 2024. É mais uma vítima da guerra vivida no Maranhão

As vítimas de Arari são Celino Fernandes, Wanderson Fernandes (pai e filho), Antonio Gonçalo Diniz, João de Deus Moreira, José Francisco Rodrigues e Joel Roque Martins Dutra.

Carlos Brandão foi cobrado este ano diretamente, de modo público, pela impunidade desses crimes.

Pacifismo à moda Sarney II

E o antigo poder oligárquico do Maranhão, presente no Palácio dos Leões, segue dobrando a aposta.

Em dezembro de 2023, foi aprovada e sancionada uma Lei estadual no Maranhão que estimula a grilagem e o avanço do agronegócio sobre terras públicas.

É neste ambiente de guerra que o Maranhão foi o estado mais desmatado do Brasil em 2023.

O abuso chegou ao ponto de a Justiça local suspender neste ano de 2024 todas as licenças ambientais concedidas pelo governo do Estado, desde 2022.

E a sociedade maranhense atualmente está mobilizada para criar uma legislação estadual que proíba a pulverização aérea de agrotóxicos.

As organizações afirmam que os agrotóxicos são utilizados como “armas químicas contra as comunidades rurais”.

E enquanto Sarney celebra “a paz no Maranhão”, o mesmo governo de Carlos Brandão lançou agora em 2024 o programa Simplifica Maranhão, “para agilizar a liberação de instrumentos ambientais”.

O objetivo é abrir caminho para o desmatamento e o avanço do agronegócio! É para passar a antiga boiada da oligarquia.

Maranhão foi o estado brasileiro mais desmatado em 2023

Mas o discurso oficial diz que com o Simplifica “o Governo do Maranhão segue diminuindo a burocracia para incentivar o setor produtivo no Estado”, para “fomentar o crescimento econômico”.

O Maranhão pede socorro!

A paz comemorada por Sarney é parte de uma operação que tenta impor um silenciamento diante de crimes e criminosos, que agem no Maranhão.

Outro exemplo escandaloso está em São Luís, a capital do estado. A cidade tem atualmente um nível de poluição absurdo, tendo hoje o ar muito mais sujo que o da cidade de São Paulo.

Trata-se de mais um problema gravíssimo, provocado pela mineração. A desgraça vem sendo provocada pela queima de carvão mineral.

Apenas três empresas têm licenças para desenvolver atividades com queima de carvão na ilha de São Luís: Eneva, Alumar e Vale.

Segundo o Sistema Único de Saúde (SUS), o número de casos de mortes em consequência de câncer e de doenças respiratórias cresceu em São Luís, acima da média nacional.

E os peixes que vivem nas águas que cercam a ilha de São Luís estão contaminados por metais pesados, oriundos da poluição do ar. Comê-los representa um risco à saúde humana, segundo pesquisa publicada nos anais da Academia Brasileira de Ciência.

São Luís tem hoje o ar mais poluído que o da cidade de São Paulo

CNBB e a ideia assassina

A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) fez uma representação, encaminhada para várias autoridades, tratando dessa enorme poluição em São Luís.

O documento foi assinado pela Regional Nordeste 5 da CNBB, órgão da Igreja Católica que abriga todas as dioceses do Maranhão. O texto fala de “violação do direito à saúde”

A Agência Tambor entrevistou Dom Gilberto Pastana de Oliveira, bispo católico e atual presidente da CNBB Regional Nordeste 5.

Ao falar da atual calamidade de São Luís e de outros desmandos no Maranhão, Dom Gilberto afirmou que essa “ideia assassina precisa ser superada”.

É exatamente o tema deste nosso editorial. Tratamos da origem de inúmeras tragédias ocorridas no Maranhão, fruto das injustiças sociais combatidas por Dom Helder.

Denunciamos a ideia que move uma antiga oligarquia. A mesma oligarquia que aumenta a matança e chega ao cúmulo de dizer que está tudo em paz.

Dom Gilberto falou sobre uma ideologia assassina
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