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Avanço da construção civil coloca São Luís à beira do colapso hídrico

Bairros de São Luís já sofrem com racionamento e falta de água nas casas.

São Luís vive o risco iminente de um colapso hídrico. As evidências já são sentidas pela população — inclusive com avisos oficiais de racionamento em razão da queda no nível do Rio Itapecuru. Mas, diante do perigo real da falta d’água, surge a pergunta: o que está sendo feito para evitar esse caos?

A questão, porém, vai muito além da estiagem ou de fatores climáticos. Na ilha, o abastecimento de água vem sendo comprometido pelo avanço desordenado da construção civil sobre as áreas verdes. O progresso indiscriminado do concreto sobre o solo impede a infiltração da água da chuva e compromete a reposição dos lençóis subterrâneos, responsáveis por abastecer boa parte da cidade.

Com as chamadas “áreas de recarga” cobertas por construções, estacionamentos, condomínios e ruas impermeáveis, a água escoa pela superfície e se perde no esgoto ou no mar.

O alerta sobre a situação crítica do abastecimento foi feito pela geóloga e professora da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Edileia Dutra Pereira. “As áreas de recarga de aquífero estão mais de 80% impermeabilizadas”, sentencia.

Os aquíferos são formações geológicas subterrâneas que armazenam água. Sem reabastecimento natural, esses reservatórios — e os poços que deles dependem — deixam de ter volume suficiente para atender à cidade. “Estamos na iminência de perdê-los”, adverte Edileia.

A pesquisadora afirma que o crescimento da construção civil sem planejamento urbano empurra a natureza ao limite. “A cidade está cheia de espaços vazios, mas o poder público segue liberando mais condomínios. Estamos ultrapassando o limite do suporte de carga da ilha”, critica. Segundo ela, o novo Plano Diretor de São Luís precisa garantir áreas permeáveis e vegetadas, condição essencial para a infiltração da água e a manutenção dos aquíferos.

A crise já atinge diversos bairros da capital maranhense — resultado de décadas de negligência ambiental, urbanização desordenada e ausência de planejamento público. “A ilha é um espaço limitado, densamente povoado, e cada pessoa consome, em média, 110 litros de água por dia. O problema é que a reposição natural dessa água não acontece mais”, explica a pesquisadora.

O que acontece no Itapecuru

De acordo com fontes oficiais, o baixo nível do Rio Itapecuru — principal fonte de abastecimento da capital — levou à adoção de racionamento na produção de água em São Luís. No entanto, segundo Edileia, a situação é agravada pela degradação do leito do rio, com desmatamento nas nascentes, avanço do agronegócio nas áreas de recarga e redução da vazão causada pelas mudanças climáticas.

Rio Itapecuru abastece mais de 50 municípios do Maranhão

“Estamos experimentando um rebaixamento muito alto do rio. Sem um plano A e um plano B, corremos o risco de ver a água da ilha acabar”, alerta a geóloga.

Edileia cita ainda outro risco: o da salinização dos poços — fenômeno conhecido como “cunha salina”, que ocorre quando a água do mar invade o lençol freático. “Já temos condomínios com poços salinizados. Isso é gravíssimo. Se não tratamos o esgoto que vemos, imagine tratar a entrada da água salgada, que não se vê”, enfatiza.

Para a professora, tanto o governador Carlos Brandão quanto o prefeito Eduardo Braide precisam assumir suas responsabilidades diante da gravidade do cenário. Ela cobra dos gestores a implementação imediata de uma política das águas, com planos emergenciais e investimentos em infraestrutura ambiental. “Todo governo precisa ter um plano A, um plano B e um plano C de contingência. É inadmissível que o povo precise comprar água para beber”, critica.

A professora também se posiciona contra a privatização da Caema, afirmando que a empresa precisa de investimentos e gestão eficiente, e não de entrega à iniciativa privada. “Privatizar não é o caminho. A Caema precisa ser fortalecida, de mãos dadas com a Secretaria de Meio Ambiente, para garantir água de qualidade e tratamento de esgoto eficiente”, defende.

Ao encerrar a entrevista, Edileia fez um apelo à consciência coletiva. “Temos que olhar a água com amor, como um bem finito e essencial à vida. Falar de água todos os dias, não apenas quando falta. O planeta é azul porque é o planeta água — e cabe a nós mantê-lo assim”, concluiu.

A entrevista completa com Edileia Dutra Pereira foi exibida no programa Dedo de Prosa, da Agência Tambor.
👉 [Acesse a entrevista].

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