
Como a sociedade maranhense vai enfrentar o bárbaro assassinato de Rubi, ocorrido há poucos dias? Ela era uma mulher trans indígena.
Para buscar respostas, vamos lembrar: no dia 15 de abril deste ano, a Câmara Municipal de São Luís, capital do Maranhão, aprovou um projeto de lei que estimula a desinformação, o preconceito, o ódio e a violência contra mulheres trans.
De acordo com essa proposta ilegal e absurda, as mulheres trans de São Luís não poderiam utilizar banheiros femininos. Houve reações pontuais da Defensoria Pública do Estado, de parlamentares e de organizações sociais. Atualmente, esse assunto — relacionado a uma lei que estimula o crime e a barbárie — está abafado.
É necessário recordar essa tentativa de legislação vinda da capital maranhense quando falamos de Rubi, vítima de um crime hediondo, associado a problemas estruturais profundos — neste caso específico, um transfeminicídio com traços evidentes de racismo.
Quem lembra de Shakira?
Na última segunda-feira (29/09), o corpo de Rubi foi encontrado às margens da MA-006, no município de Arame, a 476 km de São Luís. A cidade tem apenas 25 mil habitantes. A jovem foi assassinada com golpes de faca.

O cartel midiático oligárquico do Maranhão noticiou o caso seguindo o velho padrão de transformar sangue em mercadoria. Logo depois, instalou-se o silêncio ensurdecedor — uma mudez institucional — que revela a conivência do Estado com práticas violentas associadas à exclusão e à discriminação.
Por outro lado, o caso de Rubi provocou profunda indignação e repúdio em setores específicos (inclusive fora do Maranhão).
Existe a necessidade de pressão social para que não se instale a impunidade, além da urgência de mais políticas públicas — inclusive educativas — para o combate ao racismo, à transfobia e à violência de gênero.
A questão exige visibilidade. No entanto, pelo que se observa na própria capital do estado, se depender do status quo mantido no Maranhão, este será apenas mais um episódio incorporado à antiga paisagem, indesejavelmente naturalizada.
O governo do Maranhão, hoje comandado pelo agropecuarista Carlos Brandão, precisa ser pressionado a agir com rigor, honestidade e transparência, adotando medidas concretas para impedir qualquer possibilidade de impunidade ou manipulação do inquérito.
Vale lembrar que, ainda em 2025, no mês de abril, uma travesti indígena de 23 anos, de nome Shakira, foi encontrada morta no município de Grajaú. O corpo foi localizado boiando em um rio da região. Ela era da Aldeia Cocal. De acordo com a versão oficial, Shakira “teria morrido por afogamento”.

Conservadorismo brutal
O desafio de reagir às facadas desferidas contra Rubi torna-se ainda mais evidente quando observamos que a atual secretária de Estado da Mulher é Abigail Cunha, deputada estadual do Partido Liberal (PL).
Abigail já foi denunciada por racismo por entidades representativas das trabalhadoras domésticas, após publicar uma postagem em suas redes sociais ao lado de mulheres negras que trabalhavam em sua casa.
Além disso, a mesma deputada/secretária mantém uma escancarada aliança política com um prefeito condenado por estupro, filiado ao mesmo PL do bolsonarismo.

Quanto ao projeto de lei transfóbico aprovado este ano pela Câmara de São Luís, ele é de autoria do vereador Marquinhos (União Brasil), outro extremista, aliado do atual governador Carlos Brandão.
Na mesma semana em que o corpo de Rubi foi encontrado, o vereador Marquinhos publicou uma foto ao lado do governador em seu Instagram, com a seguinte legenda: “Tenho a honra de reafirmar minha profunda admiração e respeito pelo governador Carlos Brandão”.
Segundo o parlamentar transfóbico, o atual governo do Maranhão “tem transformado vidas, trazendo avanços reais na geração de empregos, saúde, combate à fome, educação, infraestrutura, segurança…”.
Compromisso e sensibilidade?
No Maranhão, além da Secretaria Estadual da Mulher, existem também as Secretarias de Igualdade Racial e a de Direitos Humanos e Participação Popular. A existência dessas estruturas, por si só, já representa um avanço institucional.
A questão é: existe algum compromisso real, alguma sensibilidade mínima, nas pessoas que verdadeiramente comandam o governo do Maranhão para lidar com as questões que afetam as mulheres cis e trans? As mulheres indígenas e negras?
Como se diz em nossas comunidades rurais do Maranhão, esperamos que Rubi se torne semente — e que sua memória fortaleça a luta contra a transfobia, o racismo, o machismo e todas as formas de violência que ainda seguem matando neste estado.
O que diz o governo
A Polícia Civil do Maranhão (PC-MA), por meio da Delegacia de Polícia de Arame, informa que está investigando o homicídio de Rubi.
Segundo o governo, “equipes da Polícia Civil e da Polícia Militar realizam diligências com o objetivo de coletar indícios que subsidiem o trabalho investigativo, a fim de esclarecer as circunstâncias do crime e identificar sua autoria”.
A PC-MA ressalta que novas informações serão repassadas à medida que o andamento das investigações permitir.
Já a Secretaria de Estado dos Direitos Humanos e Participação Popular (Sedihpop) informa que, “de acordo com dados do Dossiê – Mortes e Violências Contra LGBTQIA+ no Brasil, foram registradas, em 2023, oito mortes no Maranhão que vitimaram pessoas LGBTQIA+. Em 2024, já são sete mortes. Os dados de 2025 ainda estão sendo compilados”.

A Sedihpop reforça que “quaisquer situações de violação de direitos podem ser denunciadas à Ouvidoria dos Direitos Humanos pelo WhatsApp: (98) 99104-4558”.
A secretaria afirma que, com diferentes iniciativas do governo em andamento, “segue trabalhando para garantir o melhor monitoramento da violência contra a população LGBTQIA+, assim como o desenvolvimento de ações para a promoção da cidadania”.
O governo de Carlos Brandão não enviou nenhuma informação sobre o que estaria sendo feito pelas Secretarias da Mulher e da Igualdade Racial.