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Cacuriá! Cem anos de Dona Teté estimula registro da cultura popular maranhense

O Dia do Cacuriá será celebrado em 27 de junho, a data é em homenagem ao centenário de Dona Teté | Foto: Divulgação

Por Andressa Algave

Especial para a Agência Tambor

Peça a um morador de São Luís para completar o verso “Lera chorou, Lera chorou” e provavelmente a resposta será “eu te disse Lera, vão te tomar teu amor”.

Foi com melodias famosas como “Choro de Lera”, “Assa Cana” e “Jabuti” que a voz da mestra popular Almerice da Silva Santos, a Teté (1924-2011), conquistou uma legião de admiradores de várias gerações e, este ano, inspirou um projeto de lei para instaurar o Dia do Cacuriá na data em que ela completaria 100 anos: 27 de junho.

O Grupo Laborarte, casa onde Teté fundou o histórico Cacuriá de Teté (atual Cacuriá Balaio de Rosas) em 1986, anunciou algumas ações em homenagem ao centenário da musa.

Entre as iniciativas estão a produção do documentário “Pricisa, Teté: Cem anos de baile no salão da baronesa!”, que conta a história de vida de Teté e do nascimento do espetáculo, e a elaboração da PL, que transformaria a manifestação em patrimônio da cultura maranhense.

A data seria celebrada no mesmo mês da festa que inspirou o nascimento do cacuriá que conhecemos hoje: o festejo do Divino Espírito Santo, comemorado no dia 8 de junho.

A mudança no nome do grupo criado por Teté divulgada no dia 14 de junho despertou muitos comentários, polêmica e dividiu opiniões, mas provou o que já era inegável: o legado da mestra é assunto sério entre os muitos apaixonados pela cultura local.

“Me pergunto se o centenário seria tão lembrado se não fosse a mudança de nome. Mas apesar da polêmica, acho que as pessoas lembraram que ainda existem mestres e mestras populares. Vovó foi uma das poucas mulheres a ser dama da cultura popular maranhense”, contou Layna Souza, bisneta de Teté e dançarina da Cia Encantar.

Quem foi Teté?

Almerice da Silva Santos nasceu em 27 de junho de 1924 e foi apelidada “Teté” ainda bebê, nas mãos do padre de batismo, por sua pequenez. Durante a infância ela se apaixonou pelas caixas – um tipo de tambor usado tradicionalmente durante o Divino Espírito Santo.

Foto: Divulgação

Aos 12 anos, ela começou a trabalhar como empregada doméstica e por isso estudava em casa, por meio de cartilhas, sem tempo para a escola. Teté cresceu, se tornou caixeira (nome dado às mulheres que tocam caixas) e desenvolveu um elevado senso de humor.

Segundo informações do livro “Vem cá curiar o Cacuriá” (2015), da jornalista Inara Rodrigues, Teté começou a participar do Festejo do Divino com o mestre Alauriano Campos de Almeida, o Seu Lauro, aos 50 anos. Foi em 1975, quando o mestre popular fundou o primeiro grupo de cacuriá, que a vida artística de Teté começou.

A personalidade irreverente da mestra combinou com as características da dança: o cacuriá é dançado de corpo colado, com a sensualidade que faz parte da brincadeira e que desafia os olhares mais conservadores.

Ela seguiu os passos do Seu Lauro e fundou o cacuriá de Teté em 1986, e conforme o tempo se passava, cada vez mais pessoas estavam interessadas em dançar no grupo – com isso, os dançarinos foram limitados e a admissão de novos membros se tornou mais restrita.

Teté não foi a criadora do cacuriá mas ajudou a popularizar a dança, tudo com a ajuda de mulheres: contando o corpo de dançarinos e a banda, o cacuriá tem expressiva participação feminina.

Layna conta que ela mesma se identificou com a história da avó: “Ela me inspirou a ser uma mulher preta envolvida com a cultura preta, popular.”

O cacuriá

O dançarino Herick Matheus, membro do Cacuriá Balaio de Rosas, entrou no Cacuriá faz 3 anos e desde então se dedica ao grupo durante a temporada de São João, quando a agenda é movimentada.

Ele diz que dançar no grupo foi como um sonho realizado: “Meu batizado foi inesquecível, minha melhor lembrança. Significa muito o batizado com o religioso e o profano, acredito que seja um momento especial para todos os que dançam.”

A religiosidade é um elemento importante da dança. No Maranhão, um dos ritos de celebração do Divino Espírito Santo é a dança das caixeiras, em que as mulheres batem suas caixas e performam cânticos.

Quando a festa vai chegando ao fim, após a derrubada do mastro, o clima de diversão se instaura e a função religiosa se torna menos formal: é aí que o cacuriá acontece.

Com o rebolado característico e músicas de duplo sentido, o cacuriá desafiava a moral conservadora com a sensualidade inerente à vida, o chamado profano: “A dança pede uma sensualidade, mas é respeitosa, não é imoral. Temos um preparo e um cuidado para fazer a encenação, é um personagem”, diz Herick.

A dança é feita em pares formados em uma grande roda, chamada de “cordão”. Os passos se dividem entre os combinados e os improvisados, com o teor cômico da brincadeira, rebolado coladinho e muito respeito. Ao fim da brincadeira, os brincantes costumam chamar quem assiste a dança para participar do cordão.

Fotos: Divulgação

Leia também: Fundamental – Dona Mundica e Mestre Felipe serão homenageados por Tambor de Crioula

O momento é bem esperado pelo público, mas às vezes acontecem mal entendidos. Herick conta que na temporada do São João deste ano foi agredido com um tapa pelo parceiro de uma moça que foi chamada para a roda.

“Foi chocante, me deixou triste, abalado. Todos os grupos de cacuriá e outras ramificações da cultura maranhense também me ofereceram apoio. Precisamos enfrentar quem não entende que é um teatro, uma arte”, disse Herick.

Neste dia 27 está marcada uma sessão solene em homenagem a Teté na Câmara Municipal de São Luís, convocada pela vereadora Silvana Noely (PSB). A ocasião contará com a presença da família. Fazedores do cacuriá também serão premiados com um título em homenagem ao seu trabalho pela cultura popular, e uma festa será realizada no Largo de Santo Antônio.

Layna Souza, bisneta de Teté, diz que o legado da avó precisa ser destacado neste centenário. “Vamos continuar a trabalhar para que esse legado permaneça, que crianças, que nem chegaram a vê-la, saibam quem é Teté. Nós da família vamos comemorar o aniversário dela por dois dias”.

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Isis Rost

Homenagem do Laborarte: promover o apagamento do nome de D. Teté em favor das “Rosas”… 🤔😓 Lamentável!!


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