Do Blog Buliçoso
Por Flávia Regina Melo
05/03/2020
Negro, 23 anos, estudante e, como milhares de jovens do mundo inteiro, fã das séries da Netflix. Morador da área, hoje reconhecida como Quilombo Urbano Liberdade, Caio Ribeiro foi executado covardemente com um tiro na nuca após uma batida policial, no dia 25 de janeiro deste ano, em horário estimado entre meia-noite até duas horas da manhã.
Caio estava acompanhado de colegas na rua, após participar de um evento na produtora Novo Quilombo, que organiza festas de reggae e outras iniciativas artísticas relacionadas à cultura negra no bairro da Liberdade. Policiais em uma viatura não identificada abordam o jovem, fazem a revista e depois começam a agredi-lo fisicamente. Quando a revista começa a ser feita nos outros membros do grupo, um dos policiais resolve disparar um tiro contra ele. Como se não fosse suficiente, os assassinos retiram o corpo do local do homicídio, sob a alegação de que Caio não tinha família. Já morto, ele é deixado no Socorrão, na condição de indigente, segundo relato da própria mãe, aparentemente sem nenhum registro feito pela equipe policial e nem pelo hospital para onde é levado.
As pessoas que testemunharam a execução provam que o rapaz foi mais uma vítima da costumeira truculência de certos policiais: “Não bastando matar, ainda levaram o corpo do local do homicídio como se tivessem abatido um animal”, afirmou um deles. “Caio tava sentado de boa, nunca mexeu com ninguém. A Polícia humilhou, bateu e matou o cara!”, explicou outro. “Caio não estava armado, não reagiu à batida policial e tem, sim, família e amigos”, disse uma outra testemunha. Os nomes estão sendo mantidos em sigilo pelo blog para preservar a segurança das fontes.
A comunidade organizada está exigindo providências das autoridades. Mas o Comando Militar da Polícia Militar do Maranhão sequer divulgou o nome dos policiais envolvidos no crime. Em sua própria defesa, os PMs relataram que, por volta das 3 e 4 da madrugada, houve um confronto no local, que o jovem estava armado e veio a óbito após a troca de tiros. Maykon Lopes, do Centro de Integração Sócio Cultural Aprendiz do Futuro (CISAF), Alexandre Magno Muniz, da União de Negros pela Igualdade (UNEGRO) e Nicinha Durans, do Movimento Quilombo Urbano, protestam contra o genocídio da juventude negra e reagem, em nota:
“A causa dessa covardia não foi confronto algum, mas sim pelo fato de Caio ser negro, ser jovem, ser pobre e morador do maior quilombo urbano do Brasil. Caio foi vítima de racismo e de execução policial e não foi o primeiro de uma matança que cresce dia após dia”.
Marcados para morrer – O Mapa da Violência 2019 traz dados que mostram o Maranhão como um dos estados mais perigosos do Brasil para os negros. De cada 100 homicídios praticados, 91 são contra negros. O Atlas da Violência, estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostra que, em 2017, o estado foi o décimo do país com maior registro de homicídios a cada 100 mil habitantes: a cada 13,6 assassinatos de brancos, foram 35 negros mortos. A contar da execução do jovem Caio Ribeiro, sem punição aos culpados até o momento, mesmo com dezenas de testemunhas, os números devem ser ainda maiores em relação ao extermínio da juventude negra maranhense.
Nota da Redação:
Ao final da reportagem, recebemos a informação de que o Governo do Estado ofereceu reparações aos familiares de Caio Ribeiro, juntamente com todo aparato de amparo à saúde mental aos envolvidos na morte do jovem. Porém, o inquérito policial que completou um mês e o pedido de prisão preventiva dos culpados sequer foi feito pelas autoridades.