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Desmatamento absurdo! Mais de cem organizações denunciam destruição do cerrado maranhense

Foto: Thomas Bauer / acervo ISPN

Organizações da sociedade civil com atuação no Maranhão uniram-se para denunciar o avanço descontrolado do desmatamento no Cerrado. Mais de 100 organizações sociais, dos mais variados segmentos e propósitos divulgaram, nesta quarta-feira, 11, uma “Carta Denúncia sobre o Desmatamento no Cerrado Maranhense”. Além de denunciar a devastação desse bioma fundamental – onde nascem os rios que abastecem as cidades maranhenses – as organizações cobram das autoridades públicas, especialmente do Poder Executivo Estadual, uma intervenção sobre o contexto em que ocorre esse desmatamento: sempre associado a violações de direitos humanos e territoriais de povos indígenas e povos e comunidades tradicionais, no que as organizações que subscrevem a Carta chamam de “Pacote de Destruição” do Cerrado Maranhense.

A Carta Denúncia utiliza dados do Relatório Anual do Desmatamento 2023 (RAD Biomas) do MAP Biomas, publicado em maio deste ano. O RAD Biomas registra um avanço sem precedentes de supressão vegetal, transformando o Cerrado maranhense em uma “zona de sacrifício” para o agronegócio. Mais da metade de todo o desmatamento registrado no Brasil, em 2023, ocorreu no Cerrado, especialmente, na região do MATOPIBA. O Maranhão foi o estado que mais desmatou, com 331 mil hectares devastados pelo agronegócio, o equivalente a duas vezes a área da cidade de São Paulo ou meio Líbano.

O relatório se revelou uma peça fundamental para que as organizações pudessem denunciar de maneira incontestável o desmatamento no Cerrado Maranhense e também para que se soubesse o tamanho dessa devastação. Muitas das organizações que integram a Coalizão Cerrado em Pé acompanham o avanço do desmatamento nas áreas de Cerrado do Maranhão há décadas. Essas áreas integram a região chamada de MATOPIBA que também abrange partes dos estados do Tocantins, Piauí e Bahia, uma região de expansão do agronegócio, especialmente, da produção de soja, desde os anos 1980.

Conforme o RAD Biomas, o desmatamento por pressão da atividade agropecuária responde por mais de 97% de toda a perda de vegetação nativa no Brasil nos últimos cinco anos, impulsionado pela região do MATOPIBA. E, em 2023, pela primeira vez a destruição do Cerrado foi maior que a da Amazônia. O Cerrado teve com 1,11 milhão de hectares desmatados no ano passado.

O RAD Biomas também informa que o Maranhão é um dos três estados que não têm bases públicas de autorizações de desmatamento ou ações de fiscalização e que não enviaram dados para a elaboração do relatório. Exatamente esta falta de transparência e de acesso às autorizações de supressão vegetal emitidas pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Maranhão (SEMA) é uma das maiores preocupações das organizações que subscrevem a Carta Denúncia.

Protocolos e audiências

A partir do dia 11, Dia do Cerrado, representantes das organizações que assinam a Carta Denúncia sobre o Desmatamento no Cerrado Maranhense irão protocolar o documento e solicitar audiências ao Governo do Estado do Maranhão e à Secretaria Extraordinária de Controle do Desmatamento e Ordenamento Ambiental Territorial do Ministério do Meio Ambiente. O documento também será levado ao conhecimento de diversos outros órgãos e instituições, como o Ministério Público Estadual e Federal.

Mais de 100 organizações sociais já assinaram a Carta Denúncia sobre o Desmatamento no Cerrado Maranhense. A Coalizão Cerrado em Pé, um grupo menor de organizações que idealizou essa mobilização, coletou assinaturas até o dia 10.

Pacote de destruição

O desmatamento é uma questão socioambiental. Além da perda da biodiversidade, ele provoca o êxodo rural e afeta diretamente o acesso e a disponibilidade de água em condições adequadas. As organizações que assinam a Carta observam como violações de direitos humanos estão associadas ao desmatamento do Cerrado Maranhense e também à pressão exercida sobre os territórios dos povos e comunidades tradicionais, até mesmo sobre áreas protegidas, como Terras Indígenas, para a abertura de novas áreas de monocultura. Um instrumento de pressão associado é o uso indiscriminado de agrotóxicos que contaminam o solo, a água e as pessoas, diretamente.

A Carta também cita o levantamento feito em conjunto pela Federação dos Trabalhadores Rurais, Agricultores e Agricultoras do Estado do Maranhão (FETAEMA), a Rede de Agroecologia do Maranhão (RAMA) e o Laboratório de Extensão, Pesquisa e Ensino de Geografia da Universidade Federal do Maranhão (LEPENG/UFMA) que mensalmente atualizam a contagem de comunidades que são atingidas por agrotóxicos lançados de avião ou drone, o Mapa do Veneno. De janeiro a julho de 2024, 190 comunidades foram atingidas em 32 municípios maranhenses.

São milhares de pessoas com a saúde colocada em perigo. A pulverização aérea de agrotóxicos sobre as grandes plantações atinge as comunidades localizadas no entorno dessas propriedades. As pessoas acabam sendo pulverizadas por substâncias reconhecidamente cancerígenas, como o glifosato, o veneno mais utilizado no Maranhão. O estado consumiu 5,838 mil toneladas de glifosato, em 2022, conforme o Painel de Informações sobre a Comercialização de Agrotóxicos e Afins no Brasil do IBAMA.

Principais pontos

A “Carta Denúncia sobre o Desmatamento no Cerrado Maranhense” elenca mais alguns pontos de preocupação especial nesse contexto de violência:

  1. Secretaria de Estado do Meio Ambiente do Maranhão (SEMA) emite autorizações de supressão vegetal para “desmatamentos legais”, mas não concede a devida transparência sobre os processos administrativos de concessão dessas autorizações. Tampouco realiza avaliação sobre a vulnerabilidade das áreas a serem desmatadas, se são consideradas áreas prioritárias para conservação ou mesmo sobre os impactos de desmatamentos sucessivos.
  2. A ocorrência de desmatamento em áreas protegidas no Cerrado Maranhense: a Terra Indígena de Porquinhos, dos Canela-Apãnjekra, teve cerca de 2.750 hectares de vegetação perdidos; e o Parque Estadual do Mirador teve os mais elevados índices de desmatamento de uma unidade de conservação estadual do Brasil.
  1. Alterações legislativas que fomentam a devastação do Cerrado maranhense e os conflitos socioambientais: a Lei Estadual n. 12.169/2023 alterou a Lei de Terras do Maranhão para permitir a regularização fundiária de imóveis com áreas de até 2.500 ha, favorecendo desmatadores e grileiros. E a tramitação na Assembleia Legislativa do Maranhão do Projeto de Lei nº 180, de 2024 que pretende alterar os limites do Parque Estadual do Mirador*, única unidade de conservação estadual, localizada no Cerrado maranhense, sem apresentar qualquer critério técnico.

* As nascentes dos grandes rios que abastecem as cidades maranhenses, inclusive São Luís, abastecida pelo Rio Itapecuru, estão no Parque Estadual do Mirador.

  1. E a falta de fiscalização efetiva nas áreas protegidas e nas propriedades particulares; a não regularização fundiária, com obtenção e desapropriação de terras para famílias acampadas, e a demarcação das terras e territórios das comunidades tradicionais e dos povos indígenas.

Para as organizações que integram a Coalizão Cerrado em Pé, esse contexto de desmatamento e extrema violência no campo impõe uma ação emergencial e estruturante dos governos Federal e Estadual, assim como a atuação do Ministério Público, do contrário, o Estado Brasileiro será conivente com um cenário de destruição socioambiental que em breve se tornará irreversível.

Confira a Carta Denúncia sobre o Desmatamento no Cerrado Maranhense na íntegra e as organizações que a subscrevem.

Por Cássio Bezerra/Assessor de Comunicação do ISPN

Texto publicado originalmente no site do ISPN

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